Algumas razões para uma arte não demissionária
Este projeto articula um colóquio, um encontro e um projeto de curadoria
Em 1983, na Alemanha, é editada a obra Crítica da Razão Cínica, de Peter Sloterdijk, na qual o autor sublinha que a crítica, em todos os sentidos do termo, vive tempos enfadonhos. Começa de novo uma época da crítica mascarada em que as atitudes críticas estão subordinadas às funções profissionais. Criticismo de responsabilidade limitada, Iluminismo de fancaria como factor de êxito – atitude no ponto de intersecção de novos conformismos e de antigas ambições.
Trinta anos depois como revisitar a pertinência e função da crítica? Como não sucumbir à ofensiva da cumplicidade entre crítica e ordem social? Como não ser tentado pela sedução de Wagner, perguntava Benjamin, acusando Baudelaire por este defender que os artistas não conformistas e não alinhados se revoltavam contra o mercado refugiando-se na l’art pour l’art. É possível redimensionar a noção dearte pela arte através da arte política? É tornando necessária a arte política que, cinicamente, artistas, críticos, curadores e mercado mascaram a falsa consciência? Será o purismo artístico, cujo retorno parece estar a desenhar-se, a procura de um ethos que se crê a si mesmo como puro e asséptico? Aquele que o mundo da arte precisa em tempos infectados e encalhados? Sintoma da ideologia da ordem?
O Zeitgeist à la carte responde a todos os gostos: multiculturalistas, minorias, globalização, periferia, género, etnia, países emergentes... com séculos de História. Sabemos que o imperialismo simbólico pode assumir travestidas fisionomias e configurar-se em diversas semelhanças de família.
É a partir destas questões que se pretende promover um debate critico entre investigadores, curadores e artistas, reflectindo sobre as múltiplas proposições teóricas que estão na origem do consensus.
Não queremos tanto saber como chegamos até aqui, mas sim em que ponto estamos.
Projeto expositivo
Cinco exposições in situ são apresentadas por um colectivo de cinco artistas. Os conceitos de Arte, Energia e Circulação constituem interacções fundamentais por referência às singularidades dos próprios espaços expositivos.
Nas particularidades das respectivas localizações geográficas e na multiplicidade das suas historicidades, encontramos um intermezzo: a arte é energia, a energia é circulação, seja por terra ou por mar.
A partir dos espaços considerados percorrem-se as relações entre o saber e o poder, perverte-se o tempo e o espaço, escava-se no esquecimento da origem. Mais sintomatologia e menos ontologia. Menos fontes e mais descontinuidades. Nem princípio nem fim. Apenas velocidades.
Cada intervenção configura a experiência de um colectivo no qual o processo de despersonalização se constitui como disparidade de fundo.
Circulação num espaço-tempo que se expande, um entroncamento, junção e bifurcação de caminhos.
Eis algumas razões para uma arte não demissionária, a construir.